5 de out. de 2008 | By: @igorpensar

The Wall Street Bull

Por Igor Miguel

O Charging Bull ou Wall Street Bull, uma escultura em bronze de um touro feito pelo artista italiano naturalizado americano Arturo Di Modica, repousa em suas mais de 3 toneladas no Bowling Green Park próximo a Wall Street em New York. O Bowling Green Bull, como também é conhecido, tornou-se um símbolo da vigorosidade e robustez da economia americana ante as instabilidades do mercado internacional. O touro reprodutor, viril e musculoso, inspira confiança em um mercado livre, agressivo, otimista e próspero.

O Touro de Bronze remete inevitavelmente ao Bezerro de Ouro, esculpido pelos israelitas recém saídos do Egito, no deserto do Sinai diante da outorga da lei divina, a Torá. O que vemos é um povo que testemunhou os milagres da liberdade, dos valores éticos de um Deus pessoal, de uma relação real entre o Eu-Tu Eterno¹. Este mesmo povo ao se deparar com a ausência de seu libertador e profeta, Moisés, angustia-se procurando em um culto menos elaborado, concreto, respostas para seus dilemas existenciais. Com os despojos retirados dos egípcios, colares, brincos e símbolos em ouro, fundem e esculpem ante os olhos complacentes do sacerdócio araônico, um ídolo, que quase remete ao Touro de Wall Street, salvo por sua matéria prima.

Lembro-me de uma frase de meu professor Daniel Juster, quando disse que "Há um êxodo para todos os povos". Sem dúvida a experiência de emancipação dos judeus do Egito, é protótipo das aspirações de todos os povos que procuram identidade nacional e liberdade.

A história americana rememora o êxodo quando pensamos na travessia de seus colonizadores, a ruptura com a metrópole inglesa, os fundamentos éticos judaico-cristãos e como os EUA tornaram-se o símbolo de uma terra que agrega a diversidade e a liberdade, dos negros, dos judeus vindos de terras brasileiras e outras minorias, que experimentaram seu êxodo.

O grande problema é que a visão de mundo judaico-cristã, era um desafio intelectual muito grande, ante a acessibilidade aos recursos, ao dinheiro e a concretude dos despojos trazidos com a liberdade. Seus profetas se ausentaram, seus sacerdotes assistiram silenciosamente ou deixavam-se levar pela cultura de massa. Como Arão, tele-evangelistas, padres e rabinos, calaram-se, e o Bezerro de Bronze foi trazido sem permissão ao Bowlling Green Park², todos o veneravam, todos ofereceram oferendas a sua virilidade e imponência. Mamon, o antigo deus da riqueza, é agora reverenciado e personalizado através de um mercado tão autônomo, que de fato é uma coisa, uma entidade. Este deus tem sacerdotes e doutrina, sua regra de fé e prática é o laissez-faire. Os místicos judeus arrumaram uma "cabala do dinheiro" e os pastores evangélicos brasileiros vão aos EUA estudar nas escolas dos paladinos do evangelho da prosperidade.

A primeira preocupação dos dirigentes políticos e dos economistas com a queda das torres gêmeas não foi com as pessoas, mas com os consumidores, os adoradores da "besta que subiu do mar" (Apocalipse 13), o mercado.

Os americanos abandonaram o monoteísmo e tornaram-se idólatras, curvaram-se diante da soberania do dinheiro, do mercado e da riqueza, abriram mão da fé relacional e humana, por uma relação Eu-Isto (Buber), objetal, reducionista e desumana.

Muitas coisas podem ser ditas a respeito da crise econômica americana, muitos fatores estão envolvidos, uma resposta seria ingênua, mas não tenho dúvida, que de alguma forma, pode-se dizer que o problema da economia norte americana é a hipocrisia. A hipocrisia de ter impresso em suas cédulas In God We Trust, quando na prática o que se pensa é In Markets We Trust³.

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¹ Relação dialógica que determina a humanidade e a consciência ontológica dos homens, segundo o filósofo Martin Buber.
² Arturo Di Modica trouxe o Charging Bull sem permissão e licença ao Bowlling Green Park.
³ Devo essa reflexão ao artigo In Markets We Trust de Peter Laarman.

10 comentários:

André Tavares disse...

Igor, realmente o mercado é o grande ídolo de nossa época. Curioso pensar que no panteão de nossos tempos divida espaço com o Estado, não? A análise elegante revela um ponto crucial, que creio estar sintetizada numa frase do Guilherme: quanto mais barro (graça comum), mais ídolos... A prosperidade americana sem a sujeição ao Senhor alimenta mamon e desvia o povo da retidão e justiça - e espelhados na reluzente peça de bronze, tornam (ou tornamos) tudo numa relação isso-isso, coisa-coisa.

Anônimo disse...

Muito bem Igor!
No último agosto estive lá, e ecutei de uma colega de curso:"Estou me sentindo mal...nossa que esquisito é isso aqui!!! Nunca comprei tanto! Só penso em comprar,em encher minhas malas de coisas...Estou me sentindo...sei lá o quê!E eu disse: vazia?Ela : acho que sim.
Infelizmente, no Tio Sam o ter tem um papel central. A prosperidade passou a ser uma condição para ser americano. Se vc é americano e não é próspero é uma vergonha, um fracassado.
Sinto por eles, temo por nós!
Que busquemos sempre o sentido nas palavras do SENHOR: "Buscai em primeiro lugar as coisas do reino e todas essas coisas vos serão acrescentadas."
Quero manter os olhos bem abertos sempre!
Abraços,

Ana Laura

Aender Borba disse...

Parabéns meu amigo Igor,
você disse tudo que muita gente precisa ouvir. Sua refelexão é um clamor de todo aquele que entende o verdadeiro monoteísmo como a única forma possível de culto. Infelizmente, o paradigma idólatra atual não permite que as pessoas retirem o foco das "mac-bênçãos" e do deus deste século. Só para lembrar um pouco do que disse David HaMelech: "uns confiam em carros, outros em cavalos...". Muita gente prefere confiar no BULL. Que o Eterno continue te dando olhos simples para desvendar esta geração de cegos!

Anônimo disse...

Prof. Igor,
Parabéns pela matéria!
Que lição isso nos traz!!
O homem acha que pode controlar tudo e, se possível, a todos.
Agora o mundo inteiro está podendo se conscientizar - de forma clara e visível - que tudo que é do homem, fracassa!
Que nem a economia mais forte do mundo pode trazer segurança.
Que o Senhor nosso D-us nos segure firmes em Sua Mão, mantendo nossos olhos abertos, para não caírmos na mesma tentação
e assim possamos testemunhar do único que é digno de toda confiança - Aquele que nunca muda, falha ou perde!

Pela Misericórida do Eterno,
Sandra (Sandy)

Anônimo disse...

Igor,
Realmente em sua prepotencia os E.U.A estao curvando-se, pois essas quebras diarias nas bolsas do mundo inteiro e se nao a torah sendo lancada por Moises e o povo sendo engolido pela terra. Me orgulho de ser seu cunhado, quando crescer quero ser igual a vocE, te amo!!!

Anônimo disse...

Poxa, faz tempo que procuro um conteudo destes na internet, tanto do Igor como os comentarios de seus leitores, que papai do ceu use a todos voces para nos dar clareza de entendimento e compreensao do mundo moderno a luz da palavra de Deus.

Sergio Arruda disse...

Fiquei feliz em conhecer este conteudo, tanto do Igor como o comentario de seus leitores sao muitissimo preciosos, que nosso Deus abençoe e use voces para clarear nossa visao ante aos acontecimentos atuais na luz de sua imutavel palavra.

Loba disse...

Igor,

Parabéns por seu conhecimento.
E não deixe que copiem seus pensamentos. Eles são grandiosos, mas são seus.

Tomei a liberdade de postar seu blog ao meu.

Obrigada.

Fabiana de Melo.

http://lobaaespreita.blogspot.com/

@igorpensar disse...

Fabiana e Sérgio,

Obrigado pelo privilégio de vossa visita a esse espaço na virtualidade. Virtualidade que toca permanentemente na concretude de nossa rotina. Somos históricos, aqueles que fizeram história, já o fizeram, e jaz no pretérito de sua existência. Deixaram a história, mas não estão nela. Nós é que estamos aqui, fazendo história, a história atual e rotineira. Doce com seus cheiros e natureza, amargo com seus dilemas à espreita.

Discuta Som & Ruído disse...

Lembro-me de ter falado a um amigo evangélico: "Não se trabalha por dinheiro."Imediatamente ele protestou: "Trabalha-se por que então?!" Eu respondi: "Por obediência ao Eterno." Ele riu. Opróximo objetivo dele é ter uma BMW zero.