Por Igor Miguel
O Charging Bull ou Wall Street Bull, uma escultura em bronze de um touro feito pelo artista italiano naturalizado americano Arturo Di Modica, repousa em suas mais de 3 toneladas no Bowling Green Park próximo a Wall Street em New York. O Bowling Green Bull, como também é conhecido, tornou-se um símbolo da vigorosidade e robustez da economia americana ante as instabilidades do mercado internacional. O touro reprodutor, viril e musculoso, inspira confiança em um mercado livre, agressivo, otimista e próspero.
O Touro de Bronze remete inevitavelmente ao Bezerro de Ouro, esculpido pelos israelitas recém saídos do Egito, no deserto do Sinai diante da outorga da lei divina, a Torá. O que vemos é um povo que testemunhou os milagres da liberdade, dos valores éticos de um Deus pessoal, de uma relação real entre o Eu-Tu Eterno¹. Este mesmo povo ao se deparar com a ausência de seu libertador e profeta, Moisés, angustia-se procurando em um culto menos elaborado, concreto, respostas para seus dilemas existenciais. Com os despojos retirados dos egípcios, colares, brincos e símbolos em ouro, fundem e esculpem ante os olhos complacentes do sacerdócio araônico, um ídolo, que quase remete ao Touro de Wall Street, salvo por sua matéria prima.
Lembro-me de uma frase de meu professor Daniel Juster, quando disse que "Há um êxodo para todos os povos". Sem dúvida a experiência de emancipação dos judeus do Egito, é protótipo das aspirações de todos os povos que procuram identidade nacional e liberdade.
A história americana rememora o êxodo quando pensamos na travessia de seus colonizadores, a ruptura com a metrópole inglesa, os fundamentos éticos judaico-cristãos e como os EUA tornaram-se o símbolo de uma terra que agrega a diversidade e a liberdade, dos negros, dos judeus vindos de terras brasileiras e outras minorias, que experimentaram seu êxodo.
O grande problema é que a visão de mundo judaico-cristã, era um desafio intelectual muito grande, ante a acessibilidade aos recursos, ao dinheiro e a concretude dos despojos trazidos com a liberdade. Seus profetas se ausentaram, seus sacerdotes assistiram silenciosamente ou deixavam-se levar pela cultura de massa. Como Arão, tele-evangelistas, padres e rabinos, calaram-se, e o Bezerro de Bronze foi trazido sem permissão ao Bowlling Green Park², todos o veneravam, todos ofereceram oferendas a sua virilidade e imponência. Mamon, o antigo deus da riqueza, é agora reverenciado e personalizado através de um mercado tão autônomo, que de fato é uma coisa, uma entidade. Este deus tem sacerdotes e doutrina, sua regra de fé e prática é o laissez-faire. Os místicos judeus arrumaram uma "cabala do dinheiro" e os pastores evangélicos brasileiros vão aos EUA estudar nas escolas dos paladinos do evangelho da prosperidade.
A primeira preocupação dos dirigentes políticos e dos economistas com a queda das torres gêmeas não foi com as pessoas, mas com os consumidores, os adoradores da "besta que subiu do mar" (Apocalipse 13), o mercado.
Os americanos abandonaram o monoteísmo e tornaram-se idólatras, curvaram-se diante da soberania do dinheiro, do mercado e da riqueza, abriram mão da fé relacional e humana, por uma relação Eu-Isto (Buber), objetal, reducionista e desumana.
Muitas coisas podem ser ditas a respeito da crise econômica americana, muitos fatores estão envolvidos, uma resposta seria ingênua, mas não tenho dúvida, que de alguma forma, pode-se dizer que o problema da economia norte americana é a hipocrisia. A hipocrisia de ter impresso em suas cédulas In God We Trust, quando na prática o que se pensa é In Markets We Trust³.
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¹ Relação dialógica que determina a humanidade e a consciência ontológica dos homens, segundo o filósofo Martin Buber.
² Arturo Di Modica trouxe o Charging Bull sem permissão e licença ao Bowlling Green Park.
³ Devo essa reflexão ao artigo In Markets We Trust de Peter Laarman.
10 comentários:
Igor, realmente o mercado é o grande ídolo de nossa época. Curioso pensar que no panteão de nossos tempos divida espaço com o Estado, não? A análise elegante revela um ponto crucial, que creio estar sintetizada numa frase do Guilherme: quanto mais barro (graça comum), mais ídolos... A prosperidade americana sem a sujeição ao Senhor alimenta mamon e desvia o povo da retidão e justiça - e espelhados na reluzente peça de bronze, tornam (ou tornamos) tudo numa relação isso-isso, coisa-coisa.
Muito bem Igor!
No último agosto estive lá, e ecutei de uma colega de curso:"Estou me sentindo mal...nossa que esquisito é isso aqui!!! Nunca comprei tanto! Só penso em comprar,em encher minhas malas de coisas...Estou me sentindo...sei lá o quê!E eu disse: vazia?Ela : acho que sim.
Infelizmente, no Tio Sam o ter tem um papel central. A prosperidade passou a ser uma condição para ser americano. Se vc é americano e não é próspero é uma vergonha, um fracassado.
Sinto por eles, temo por nós!
Que busquemos sempre o sentido nas palavras do SENHOR: "Buscai em primeiro lugar as coisas do reino e todas essas coisas vos serão acrescentadas."
Quero manter os olhos bem abertos sempre!
Abraços,
Ana Laura
Parabéns meu amigo Igor,
você disse tudo que muita gente precisa ouvir. Sua refelexão é um clamor de todo aquele que entende o verdadeiro monoteísmo como a única forma possível de culto. Infelizmente, o paradigma idólatra atual não permite que as pessoas retirem o foco das "mac-bênçãos" e do deus deste século. Só para lembrar um pouco do que disse David HaMelech: "uns confiam em carros, outros em cavalos...". Muita gente prefere confiar no BULL. Que o Eterno continue te dando olhos simples para desvendar esta geração de cegos!
Prof. Igor,
Parabéns pela matéria!
Que lição isso nos traz!!
O homem acha que pode controlar tudo e, se possível, a todos.
Agora o mundo inteiro está podendo se conscientizar - de forma clara e visível - que tudo que é do homem, fracassa!
Que nem a economia mais forte do mundo pode trazer segurança.
Que o Senhor nosso D-us nos segure firmes em Sua Mão, mantendo nossos olhos abertos, para não caírmos na mesma tentação
e assim possamos testemunhar do único que é digno de toda confiança - Aquele que nunca muda, falha ou perde!
Pela Misericórida do Eterno,
Sandra (Sandy)
Igor,
Realmente em sua prepotencia os E.U.A estao curvando-se, pois essas quebras diarias nas bolsas do mundo inteiro e se nao a torah sendo lancada por Moises e o povo sendo engolido pela terra. Me orgulho de ser seu cunhado, quando crescer quero ser igual a vocE, te amo!!!
Poxa, faz tempo que procuro um conteudo destes na internet, tanto do Igor como os comentarios de seus leitores, que papai do ceu use a todos voces para nos dar clareza de entendimento e compreensao do mundo moderno a luz da palavra de Deus.
Fiquei feliz em conhecer este conteudo, tanto do Igor como o comentario de seus leitores sao muitissimo preciosos, que nosso Deus abençoe e use voces para clarear nossa visao ante aos acontecimentos atuais na luz de sua imutavel palavra.
Igor,
Parabéns por seu conhecimento.
E não deixe que copiem seus pensamentos. Eles são grandiosos, mas são seus.
Tomei a liberdade de postar seu blog ao meu.
Obrigada.
Fabiana de Melo.
http://lobaaespreita.blogspot.com/
Fabiana e Sérgio,
Obrigado pelo privilégio de vossa visita a esse espaço na virtualidade. Virtualidade que toca permanentemente na concretude de nossa rotina. Somos históricos, aqueles que fizeram história, já o fizeram, e jaz no pretérito de sua existência. Deixaram a história, mas não estão nela. Nós é que estamos aqui, fazendo história, a história atual e rotineira. Doce com seus cheiros e natureza, amargo com seus dilemas à espreita.
Lembro-me de ter falado a um amigo evangélico: "Não se trabalha por dinheiro."Imediatamente ele protestou: "Trabalha-se por que então?!" Eu respondi: "Por obediência ao Eterno." Ele riu. Opróximo objetivo dele é ter uma BMW zero.
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