17 de jul. de 2017 | By: @igorpensar

A Janela

Levantou-se ainda vacilante, em uma espécie de limbo entre sonolência e sobriedade. Ali em corpo, pés desnudos que relutantes tocavam o chão gelado, ergueu-se, foi até a janela. Seu olhar vagava como que procurando uma terra a se ir, um destino. Seduzido por suas oscilações, suas matizes e degradês, irrompeu em um suspiro que vinha de lugares virgens, terras raramente visitadas. Aspirou por sentido, mas lamentou por nem sempre ter condições de ver tal mundo sorrindo. 

Com olhar marejado, lamentou não poder eternizar aquele momento, lamentou seu cinismo, incredulidade e o coração embrutecido. Viu cores, formas, nuvens que não lhe eram peculiares. Percebeu que não tinha como ficar entendiado ante tal brincadeira que a graça lhe aprontava. Quis entrar na dança, mas lhe faltava o ritmo, quis solfejar uma cantiga, mas sua voz desafinava. Com um discreto sorriso, ainda constrangido, corou-se diante da glória. Preferiu aquietar-se, e batizado de gratidão voltou-se para seu recôndito, desta vez, trazendo consigo a luz da coreografia que acabara de testemunhar em uma janela.
12 de jun. de 2017 | By: @igorpensar

Esperança que não se Desmancha

Estamos relativamente convencidos, independente do espectro político, que seres humanos são buscadores de um reino onde podem florescer plenamente como tais. Mas sobre como acessar este reino é onde divergimos.

Para alguns, ele será alcançado levando o indivíduo ao nível máximo de liberdade individual. Para outros, quando a coletividade se afirmar sobre as particularidades teremos o paraíso. Bem, esta é a velha tensão entre universais e particulares.

Nesse balaio, estão cristãos, aqueles que deveriam superar a tentação secular de "imanentizar" (Charles Taylor) suas esperanças, como fazem as duas opções aí citadas. Ou seja, a tentativa secular de procurar respostas na realidade criada e não no Criador.

Cristãos são peregrinos. Eles agem a partir da única realidade que não foi corroída pela mortalidade. Tudo enferruja, se "desmancha no ar", menos o Ressuscitado. Ele não só venceu, mas é causa (Verbo) de toda realidade. Desde sua ressurreição sabe-se que a história tem um destino que não pode ser alterado por paixões ideológicas. Toda tentativa de reforma histórica está fadada ao fracasso, pois não há ação neste tempo que não se deteriore ante a glória do Cristo ressuscitado. Podemos promover algum tipo de melhoramento temporário, e que o façamos, mas em breve ele será subvertido como barro misturado com ferro.

Toda história que se julgue durável deve estar entrelaçada com a história de Jesus Cristo: Ele ressuscitou e voltará. Mas, esta história não se encontra em grandes projetos civilizatórios, experimentos sociais, ideologias batizadas ou discursos produzidos por engenheiros da nova mídia digital. Ela emerge do túmulo vazio! Não é revolucionário, no sentido de que é possível fazê-lo mobilizando forças sociais, é redentivo e providencial. Este reino é uma cidade que desce do céu, não é produzido debaixo para cima, como Babel. Não é torre, é um tabernáculo celestial.

Muitos alegariam: não é este o escapismo evangélico-monástico que queremos superar? Não, esta é a ressurreição que educa o triunfalismo evangélico desajeitado e impulsiona a presença fiel dos crentes em um mundo fraturado pelo pecado. Temos um nome pra isso: esperança.
2 de jun. de 2017 | By: @igorpensar

Hombridade Radical

Apesar das pressões culturais, das narrativas que tentam feminilizar a realidade, que tentam impor uma sensibilidade desprovida de força e coragem, já passou da hora de homens redescobrirem sua vocação masculina.  

O desafio está posto: ser pai, marido e homem. Lutar para que o sustento chegue em casa, amar uma única mulher, e engajar-se valentemente em amá-la, e os filhos. Homens que instruem seus filhos nos valores e na suficiência do amor de Cristo. Homens que ensinam a partir de seu comprometimento e carinho pelas esposas. Homens que são firmes em suas decisões morais, sábios, não abusivos, mas que não são amanteigados na hora de dizer "sim" e "não".  Mas, homens suficientes em admitir o erro, a destemperança e a tolice, esposa e filhos te amarão mais, e sua masculinidade não será comprometida por isso, ao contrário, será amadurecida e legitimada.

Homens que são protetores da integridade física e moral de sua família, que catequiza, que acorda a família para ir ao culto dominical. Não é família tradicional, apenas, é a família cristã.   Vamos fazer uma "revolução" de verdade?  Vamos deixar este videogame de lado, a cachaçada, a pornografia, as fantasias e vamos amar nossos filhos e esposas.  E, acima de tudo, amar a Deus, e conduzir nossas famílias até Ele.

A educação de nossa casa é tarefa nossa, a proteção e amor que nossas esposas precisam, é nossa tarefa, o sustento é tarefa nossa, romper os grilhões da preguiça e da procrastinação é tarefa nossa.  Então, homens cristãos, erguei-vos sem a idolatria machista.  Somos guerreiros, fomos feitos para a guerra, aquela de verdade, aquela que é travada contra o pecado, a promiscuidade, o egoísmo, os demônios e a tentação do autoritarismo.  E, você que não é cristão ou vive um cristianismo relapso, te convido a fazer parte deste movimento e redescobrir sua masculinidade à luz do Evangelho de Jesus.  Com os pés nas Escrituras e olhar fixo em Cristo, vivamos nossa hombridade com coragem e para a glória de Deus!

Audax at Fidelis!
19 de mai. de 2017 | By: @igorpensar

Outra Cidadania

Somos criaturas exiladas, sempre a procura de um mundo deixado para trás. Inquietos, nos esforçamos para criar realidades alternativas e paraísos artificiais. Projetamos expectativas messiânicas, abraçamos narrativas temporais e estamos em busca de alguém que nos lidere na construção de uma cidade refúgio por falta de um jardim.

Em tempos de instabilidade e incertezas políticas, temos que nos lembrar que auto-afeição é fundamento da "cidade dos homens", e que, aqueles que são peregrinos em suas ruas possuem uma missão. Nossa tarefa como cidadãos de outra realidade, gente cujo passaporte é da "civitas Dei", é convidar as pessoas a obter cidadania em um território reminiscente porém renovado.

Refiro-me a uma cidade-jardim que vem como dádiva, cidade dada, não construída, um santuário não feito por mãos humanas. Cristãos são arautos de uma realidade iminente, e conclamam a toda gente que se aproprie da chave que está nas mãos daquele que é a porta da Nova Jerusalém.

Abandone sua utopia e abrace a esperança!
24 de mar. de 2017 | By: @igorpensar

Cegos por Excesso de Luz

Deus é portador de toda Luz.  Não há energia, brilho ou claridade neste universo que não proceda dele, que não tenha, em última instância, Deus como sua fonte.  Porém, sua intensidade é, em grande medida, uma dose muito extravagante de sobriedade.  Para gente acostumada à penumbra e escuridão isso é muita clareza.  Hoje, os homens ficam cegos quando olham para Cristo, não por falta de luz, mas por seu brilho excessivo.  Ele é verdade tão nítida, tão intensamente narrada, que nos embaraçamos.

Deus quis tornar sua luz minimamente acessível, 'se fez carne e habitou entre nós',  'vimos a sua glória', e definitivamente, 'Ele era a luz dos homens'.  Mas, ainda assim, o brilho era intenso, suas palavras demoram a ser compreendidas, e finalmente, apropriadas.   Por esta razão, não raramente, ouvimos gente dizer que entendera um versículo recorrentemente lido, mas que pela primeira vez fez sentido.  Um raio de luz da glória do Filho perpassou as letras, a tinta e as finas páginas da Bíblia, e assim, lançou nitidez ao coração peregrino.  

Digo tudo isso, pois versículos e trechos claros como os que se referem a 'auto-negação', 'perder vida', 'tomar a cruz', 'renúncia', 'fazer a vontade de Deus' e similares, tornam-se nítidos, mesmo depois de algum tempo de intensa meditação.  Confesso que ainda me debruço, medito, e sempre mais luz projeta-se de lá.

No meu caso, libertar-se de algumas tentações, fontes de pecado e de flertes com a auto-afeição, estão caminhando para o sepultamento.  Experimentar a quietude, a negação de falsa existência, da ilusão de relevância, que no fim, não passam de pixels de bits.   A realidade não se fez post, se fez carne, e habitou entre nós.

Quanto custa a liberdade de um cristão?  Custa a negação da vontade do Filho e a adesão à vontade do Pai.  Custa a renúncia da vontade própria, por uma vontade maior.  Mas quem pode fazer tal loucura?  Os loucamente arrebatados de amor pelo Pai, os feridos pelos raios de glória.  Ouse abrir mão, tome uma decisão radical, busque a quietude, o silêncio e doses de "desaparecimento".  Deixe Cristo te encaminhar para a lucidez.

Peregrine em direção à cruz.  Vá até o Cristo.  Não tema mais um golpe no velho homem.  Parece morte, esquecimento e anonimato, mas é o desaparecimento em Cristo, para encontrá-lo, e assim, se reencontrar novo nEle.  

Se Cristo te chamou, ele não falhará, em suas veredas fará tudo que lhe apraz para que você seja todo dele.  Cada vontade, paixão, pulsão ou desejo, ele não te dará descanso até que tudo seja entregue a Ele.  Esta é sua liberdade, todo sentido que buscas.
5 de jan. de 2017 | By: @igorpensar

Casamento x Romantismo

Casamento não é uma instituição romântica. O romantismo é um movimento de apenas 250 anos. O casamento existe antes disso. O casamento é prioritariamente o lugar onde uma comunidade se forja sob outros critérios. E, se você confunde afeição, amor e expressões de afago com romantismo, que é a meu ver, um tipo de soteriologia (doutrina da salvação), pode ser um importante indício de seu cativeiro.

Casamentos estão aos cacos ou acabando porque as pessoas ainda estão cativas do romantismo. Alain de Botton* insiste que as "pessoas casam para fazerem um sentimento legal permanente", querem engarrafar a "alegria que sentem". A honestidade de Botton é perturbadora mas realista: "Escolher com quem nos comprometeremos é meramente um caso de identificar que tipo de variedades de sofrimentos nós gostaríamos mais de nos sacrificar", mas o sacrifício é inescapável no casamento. E, se você, já quer correr dele, veja se sua mente não está acorrentada a uma invenção cultural de menos de três séculos.

Um pouco de realidade ajuda muito o casamento. Não é um "encaixe" perfeito onde demandas são satisfeitas, é um lugar onde nos tornamos maiores do que nossas demandas exigem, mas nunca sem negação de si, sem renúncia e sem sacrifício. O contrário disso é um eterno jardim de infância criado pela imaginação romântica. Casamento não salva mas é o melhor lugar para nos tornarmos adultos.