14 de jul. de 2010 | By: @igorpensar

A Narrativa se fez Carne

Por Igor Miguel

O epílogo de João começa com a famosa máxima teológica: o verbo se fez carne. O tema sobre o “divino virar gente” foi tão forte nos primeiros séculos da Igreja que foi necessário desenvolver uma teologia da encarnação. Uma fresca reflexão sobre o tema tem passado por minha cabeça. Tentarei apresentá-la por um viés simples, integrando os ecos da tradição e as novas demandas teológicas.

12 comentários:

Mara disse...

Novo e vivo caminho ...imagem de Deus ...
É impolgante demais ...preciso inflamar com a minha devoção e paixão depois de ler essas verdades, entusiasmo para buscar mais e mais ...Minha vida, minha nova narrativa em justiça.

Daniella Teixeira disse...

Excepcional, Edificante, Inspirador!!!
Obrigada por mais uma aula.
Estamos aprimorando juntos...

Dani e Rodrigo.

Guilherme de Carvalho disse...

Muito bom Igor.

Realmente o sentido desse "revestimento de Cristo" merece mais atenção. Fica muito claro que a imitação de Cristo no discipulado (evangelhos) e a união com Cristo no batismo (Paulo) são formas de dizer o mesmo.

Victor Bimbato disse...

Muito bom, Igor. God bless ya, bro! Vc tem adicionado mt a minha vida! E com esse texto, mais uma vez, me sinto enriquecido para poder levar um pouco de conhecimento aos meus próximos! Valeu!

Jorge Fernandes Isah disse...

Igor,

ótimo texto.

Seu último parágrafo reflete bem o que é o Cristianismo, não como mais um caminho ou um entre tantos modelos, mas como a própria VIDA. A qual nos enche da mais viva esperança de que, um dia, seremos iguais, conformados à imagem de Cristo.

É a eternidade sendo temporal para novamente ser eterna [calma, tentarei explicar]; porque somos herdeiros, e ainda herdaremos; somos feitura de Cristo, e ainda por ser feitos; santos, e a santificar; perfeitos, mas sem desfrutar completamente da perfeição.

Erwin Lutzer escreveu que, pela manhã, sempre orava a Deus assim: Senhor, peço que não me vejas como sou, mas me vejas através do teu Filho Amado, Jesus Cristo [citação livre].

Creio que Deus nos vê como Cristo, ainda que não sejamos como Ele; mas o revestimento ao qual descreveu, já aconteceu eternamente, ainda que no tempo, esteja a se cumprir em nós.

Forte abraço!

Cristo o abençoe!

Maurílio disse...

O mundo incoerente diviniza o que é fugaz e perece, e rejeita a revelaçao máxima do amor e poder de D'us, Yeshua. O magnífico, extraordinário é que ELE de glória em glória nos santifica no processo inverso, para que enquanto humanos que somos nos tornemos como ELE, ao atingirmos a estatura de varão perfeito.
Glória à Aquele que vive e reina para sempre.
Shalom amados.

@igorpensar disse...

Jorge e Maurílio, obrigado por vossos comentários. São sempre bem vindos e inspiradores. São produções à parte.

Abraços!

marcelo valle disse...

A teologia da encarnação foi "formulada" justamente para dar coerencia interna ao dogma da trindade, em relação a pessoa de Jesus. Esta "teologia" em minha opinião não é bíblica.

Ela não surgiu estritamente a partir do texto da Escritura. Foi o resultado da influência de certas crenças e atitudes que prevaleceram em torno da igreja cristã, após o primeiro século.

A preexistência humana de Jesus e a incompreensão da linguagem joanina contribuíram para o ensino de que Deus se tornou homem, que é a essência da chamada “teologia tradicional da encarnação”.

O maior erro é justamente querer compreender o "LOGOS" de João sob uma perspectiva Filônica e não segundo as escrituras judaicas. Filo tentou mesclar judaismo com filosofia grega e por isto compreendeu O LOGOS como "principio ordenador de Deus", O Primeiro-nascido, que estava entre ele e poderia romper a criatura do Criador... Ele é sem começo de dias, como Deus é, nem é gerado, como somos, mas é algo entre esses extremos, está conectado com os dois.

LOGOS não é e nunca foi uma pessoa. Significa o PLANO E A AÇÃO DE DEUS, que foi expressa quando Jesus nasceu e que antes de seu nascimento Ele não existia, a não ser na mente de Deus.

Há pelo menos dois problemas com o modelo tradicional da Encarnação:

(1) o problema dos egos
(2) o problema da natureza dual.

Qual ego Jesus possuía? Se Jesus tinha dois egos, o divino e o humano, então não é Jesus duas pessoas com dois conjuntos distintos de memórias, desejos e pensamentos?

Se Jesus não tem um ego divino, em que sentido ele é divino?

Se Jesus fosse controlado inteiramente por um ego divino, em seguida, ele teria consigo memórias das eras passadas. Ele recordaria o dia em que foi formado Adão, e no dia em que os anjos cantaram de alegria quando o universo foi criado.

Se ele realmente manteve seu ego divino através da Encarnação, em seguida, como ele poderia ter aprendido a obediência? (Hebreus 5.8), ou crescido em sabedoria (Lc 2.52), e não saber o dia de seu retorno (Mc 13,32)?

Alguém deveria se perguntar como um preexistente “Deus Filho” pode se tornar um homem sem qualquer “diminuição da divindade” e de certos “atributos divinos”, ou como ele poderia viver uma “completa humanidade”, sem deixar de exercer as funções divinas que tinha vindo a exercer desde a eternidade passada?

Aqueles que realmente conviveram com Jesus o encontraram completamente e
naturalmente um ser humano [homem]. Jesus não lhes parecia ser uma pessoa com características indeterminadas, na qual o humano e o divino se misturavam, ou uma
espécie de semideus grego, metade homem, metade deus. Não havia nada de anormal com ele. Ele era um homem entre os homens, como um homem normal é em si mesmo, e não encontraram também nenhuma dificuldade em chamá-lo de homem.

O verdadeiro "modelo da encarnação" deve ser capaz de explicar esse ser humano simplesmente.

E aqui está o cerne da questão: se um SER pré-existe ao seu nascimento humano, este SER NÃO É UM HUMANO POR ORIGEM, então poderia ser dito honestamente que este SER SERIA HUMANO após o nascimento? Não estaria esse alguém vestido como um homem, usando a humanidade apenas como um manto? (docetismo).

Deixo uma frase importante, escrita por John Knox em - A HUMANIDADE E A DIVINDADE DE CRISTO,pág. 106

- "PODEMOS TER A HUMANIDADE [DE CRISTO] SEM A PREEXISTÊNCIA E PODEMOS TER A PREEXISTÊNCIA SEM A HUMANIDADE. NÃO SE PODE ABSOLUTAMENTE TER AMBAS AS COISAS".

Saudações no Messias Jesus

Marcelo Valle.

@igorpensar disse...

Marcelo, tudo bem?

Primeiro temos que ter clareza que o Novo Testamento e suas conclusões teológicas não são simples derivações do AT, resultam de uma complexa construção hermenêutica, deriva em grande parte do substrato "midráshico" (judaico) do I século. A doutrina da encarnação é um desenvolvimento interessante, tem raízes na percepção personalizada da "sabedoria" (Pv 8) que depois se associou ao "logos" e ao "memra" aramaico. Uma olhada em eclesiásticos (livro pré-cristão) comprova que a doutrina da "encarnação do verbo" é mais antiga do que você propõe, veja este trecho:

“Saí da boca do Altíssimo e como a neblina cobri a terra, armei a minha tenda nas alturas e meu trono era coluna de nuvens. [...] Junto de todos estes procurei onde pousar e em qual herança pudesse habitar. Então o criador de todas as coisas deu-me
uma ordem, aquele que me criou armou a
minha tenda [skênên] e disse: 'Instala-te em Jacó, em Israel recebe a tua herança'”. (Eclesiástico 24:3,4,8 e 9 - Septuaginta).

Se Jesus não fosse Deus encarnado, temos um problema na própria consumação da redenção. Jesus tinha que ter uma divindade para renunciá-la em suas ações (Fp 2:7). Eu concordo com você sobre a humanidade de Jesus, exatamente sua humanidade que torna o evangelho magnífico, mas uma humanidade que tinha a possibilidade de se valer dos atributos divinos, para em sua renúncia, vence.

Observe, Jesus fez justamente o caminho inverso de Adão. Adão caiu por ambicionar um poder que não lhe era por direito (a autonomia) e Jesus venceu por renunciar exatamente este poder que lhe era por direito. Sem o "poder", não haveria renúncia (kenósis), sem a renúncia (kenósis) não haveria redenção do homem.

Sem divindade, a tentação no deserto não faria sentido. Não está Satanás o tempo todo provocando a filiação divina? (Se tu és o filho de Deus...) E Jesus triunfa sobre o mal sem se valer destes atributos.

Foi precisamente este elemento que me levou a considerar o fato de que a encarnação da divindade é fundamental para minha salvação e redenção dos homens que se chegam a este mistério por graça.

Obrigado por suas impressões.

Abraços,
Igor

marcelo valle disse...

Quando Paulo disse a Timóteo que "desde a sua meninice, Ele sabia as sagradas letras (na KJV - sagradas escrituras)que o podia fazer sábio para a salvação pela fé em Cristo (2 Tim. 3:15), pergunto: A que "ESCRITURAS" Paulo se referiu?

Outro ponto: Que escrituras, os nobres bereanos deveriam "examinar para ver se as coisas [referentes a Cristo] eram de fato assim" (Atos 17:11), Lucas se referiu?

Não haveria "provas" contundentes da Messianidade de Jesus, se estas não fossem encontradas e confirmadas no Tanak, mesmo que os judeus não aceitem os fatos. Não apenas da Messianidade, como de vários aspectos da vida, morte, ressurreição e governo do Reino de Deus na terra. De que forma então, isto não representa uma "derivação" do AT, como proposto?

Se vocÊ olhar a história, comprovará que foi justamente Fílon quem influenciou os "pais da igreja", Justino, Clemente, etc e daí poderia assim dizer, começou a se formar o embrião que mais tarde deu origem ao dogma trinitariano, mas antes obviamente, esse embrião começou com a "preexistencia do LOGOS". Basta olhar o credo Niceno para confirmar isto.

Concordo plenamente com vc, quando faz um paralelo entre Adão e Cristo. Concordo, porque o que vc disse é bíblico (Rom. 5:12,19 / 1 Cor. 15:21,22) e é justamente por este ângulo que se podem compreender passagens como as de Filipenses 2:5-11 e Col. 1:15,16.

Que tipo de "poder" vc acha que Jesus recebeu e que logo em seguida fez com que fosse tentado?

Deus não pode ser tentado pelo mal e a ninguém tenta, então como poderia Jesus ser "divino", nos moldes trinitarianos, e como vc diz "fazer sentido" a tentação?

Faz muito sentido compreender a minha e a sua tentação, se Jesus foi exatamente um ser humano como eu e vc. Este é um sentido que acredito vc não aceita mais, que é o sentido "representativo". Jesus é o nosso representante diante do Eterno Deus, O Pai. E o que o qualifica ao status de Filho de Deus é sua origem pelo poder do espirito santo no ventre de Maria [sua concepção virginal].[Lucas 1:35 / Mateus 1:18,20].

Como posso me unir e me revestir de um Ser, que em muitos aspectos difere de mim? Um ser preexistente, um ser que não sofreu de fato a tentação [pois era Deus e Deus não pode ser tentado], um ser cuja origem na verdade não está na esfera do humano, pois sua "encarnação" não é considerada como seu inicio, mas como o rompimento de um estado para o começo de outro?!

Abraços e obrigado pelas respostas.

Marcelo

@igorpensar disse...

Marcelo,

Pois é, não posso acreditar em divindade representativa. Observe, Jesus não pode ser simplesmente um homem que foi tentado e venceu, a tentação dele é maior, pois sofre a tentação como um homem, sob a possibilidade de valer-se de seus atributo divinos para vencer, porém sem o fazê-lo. Sua vitória é muito mais impressionante e o mais forte, é que significa, que sem a "kenosis" (esvaziamento) não haveria re-dignificação do homem.

Insisto, que acho preocupante sua abordagem do NT, ele está mais próxima de uma aproximação liberal, exatamente o tratamento que não quero dar. Negar a divindade essencial de Jesus o coloca em um patamar depreciativo, arranca-lhe a dignidade e a grandeza de seu triunfo, como também o seria, se considerarmos que seu triunfo sobre o pecado valeu-se de sua divindade.

Abraços,

@igorpensar disse...

Marcelo, outro ponto, qual o problema da influencia alexandrina?

Em algum sentido, como as pesquisas judaicas atuais vem demonstrando, este elemento foi necessário para o enriquecimento da própria doutrina cristã. O judaísmo alexandrino é parte do complexo judaísmo do I século, que insisto, não pode ser desprezado. Não existe um retorno ao Tanach desprovido de uma visão religiosa 'a priori'. Mesmo os "bereanos" valiam-se de alguma tradição. A neutralidade hermenêutica sim é parte de um purismo helênico, Jesus vale-se (bem como os apóstolos) de muitos elementos da interpretação religiosa do I século. Neutralidade é ingenuidade.... Deus opera de forma complexa no processo de revelação valendo-se da revelação escrita, da tradição e das impressões religiosa de determinado tempo.


Abraços!